
MULHERES NO COMANDO: IGUALDADE DE GÊNERO ÀS VÉSPERAS DA COPA DO MUNDO FEMININA DE 2027
Por: Daniela Santos
No dia 11 de novembro aconteceu a segunda edição no Brasil do Sport Integrity Forum Latin America 2024. O evento organizado pela SIGA Latin America em parceria com o São Paulo Futebol Clube reuniu diversos profissionais de destaque do setor esportivo, e a escolha do Brasil como sede da próxima Copa do Mundo Feminina, que será em 2027, foi um dos assuntos abordados.
Ao lado das especialistas Bruna Kellerman (Advogada, Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense), Cátia Veloso (Sócia-fundadora, Maria Quitéria) e Olga Bagatini (Coordenação, Advocacy e Parcerias para Esporte e Igualdade de Gênero, ONU Mulheres Brasil), Suleima Sena (CEO, Donas do Jogo), moderou o debate sobre equidade de gênero e os caminhos que o nosso país precisa trilhar para alcançar um cenário melhor para um evento tão importante mundialmente.
Durante o papo, Bruna Kellerman recordou que a CBF (Confederação Brasileira de Futebol) determinou que todos os clubes que disputam a Série A são obrigados a ter equipes femininas. “Para uns podem ser um problema, mas para outros é um meio de chegar a finalidade. Eu penso que é a visibilidade da oportunidade e é um dos nossos principais pontos”, disse a advogada.
Cátia Veloso pontuou a necessidade de acabar com a discussão de que “investir em futebol feminino não traz retorno, que mulher não joga futebol como homem, que os patrocinadores não estão interessados e que a TV não quer transmitir”. “Os dados falam por si só. O crescimento da cobertura da Copa de 2019 foi de 25%. Temos uma projeção de crescimento de 38% na próxima Copa”, afirmou ela, ressaltando que as bases femininas precisam ser incentivadas.
“Precisamos tirar da mesa a discriminação e o preconceito com mulheres que praticam esporte como qualquer outro. Lá atrás disseram que o futebol era só para homem e fim. Precisamos tirar isso da pauta, porque isso é um viés inconsciente nosso. A Copa do Mundo é um evento gigantesco, cheio de visibilidade, mas precisamos que as pessoas que estão sentadas à mesa, com poder de decisão e com a caneta na mão, estejam dispostos a intencionalmente bancarem essa equidade”, afirmou.
Olga Bagatini reforçou que a Copa do Mundo no Brasil será uma oportunidade de “desenvolver o futebol feminino no nosso país, colocá-lo em outro patamar e trazer mais visibilidade”. “Após a Copa do Mundo na Austrália (2023) um número absurdo de meninas procuraram clubes para jogar”, recordou ela, ressaltando que o evento também deixará um legado. “Não só para que essas meninas depois tenham espaços em todos os lugares do Brasil para continuar jogando, mas também em termos de estrutura… É uma prerrogativa da FIFA ter mulheres na organização da Copa, em posições de tomada de poder no comitê organizador para que essa estrutura possa ser uma oportunidade para que essas mulheres não só desenvolvam habilidades necessárias para ocupar esses espaços depois que a Copa for embora, mas também para que elas sirvam de exemplo de inspiração para outras mulheres. Por ser um ambiente dominado por homens, as mulheres muitas vezes não seguem esse caminho por não se verem representadas ali. Se isso for bem trabalhado, ficará esse legado de mulheres que sabem trabalhar nas mais diversas instâncias da cadeia esportiva e que sirvam de referência para mais meninas que vem chegando”, acrescentou.
Mulheres ocupando cargos de liderança
A advogada Bruna Kellerman também falou sobre os maiores desafios que as mulheres enfrentam para ocupar cargos de liderança nos clubes. “Tudo que acontece em um clube de futebol é uma amostra da sociedade… Segundo dados do IBGE, apresentado no Dia da Mulher em março deste ano, as mulheres concluem o ensino médio, ensino superior, são mais pós-graduadas, mais especialistas que os homens, quase de 10 a 20% e os homens tem 36% de uma remuneração maior que as mulheres. As coisas de fora se aplica aqui dentro [nos clubes].”
“Além dos desafios de estar em um ambiente machista e masculino, temos esses desafios que ditam uma sociedade de forma geral… As partes interessadas que estão dentro desses ambientes precisam trabalhar em prol, não é só da atleta, não é só da profissional, é dos prestadores de serviço… É desafiador, mas ideias temos”, completou.
Cátia acrescentou que apenas 28% das mulheres ocupam papel de liderança nas empresas e nos clubes de futebol, principalmente no Brasil, esse número é bem menor. “A gente precisa de uma mobilização social e é multidisciplinar porque são muitos setores: é o poder público, é o terceiro setor, são empresas privadas, clubes associativos, a sociedade civil na totalidade… Estamos muito tempo atrasados… A CBF precisa se mobilizar enquanto instituição porque ou vem e cima para baixo também ou efetivamente a gente não consegue sair de onde estamos. É muito bobo pensar que equidade é só um problema do futebol, é um problema social”, refletiu.
Além de ter mulheres ocupando cargos de liderança no meio esportivo, também é importante estimular o público a consumir esportes femininos. Para Olga Bagatini, a Copa do Mundo no Brasil em 2027 será a maior oportunidade de visibilidade, apesar de que em 2019, com a transmissão da TV Globo, já houve um impacto. “Quando a TV começou a mostrar eles descobriram que as pessoas queriam assistir, e a gente vê ano após ano recordes de público na TV, pessoas enchendo os estádios no futebol brasileiro, no futebol da América Latina… Eu acho que a população vai se engajar… e a imprensa tem esse poder de determinar como as pessoas percebem o esporte, então é uma responsabilidade muito grande”, analisou.
Diretos das mulheres no esporte
Segundo a advogada Bruna Kellerman, após a obrigação dos clubes de terem times femininos, “existem muito mais jogadoras profissionais com carteiras assinadas do que existia anteriormente”. “Em 2019, tendo um investimento maior da mídia, podemos ter novos investidores, mais dinheiro para dentro dos clubes. Com mais dinheiro, mais investimento no futebol”, disse ela, citando o Grêmio como exemplo.
Ela também falou sobre a importância da Lei Geral do Esporte, que trouxe a obrigação de que as entidades desportivas tenham ao menos 30% dos seus cargos diretivos preenchidos por mulheres. Além disso, a nova lei garante direitos às atletas gestantes ou puérperas.
A ONU Mulheres também se preocupa com o desenvolvimento das meninas como atletas e em 2020, foi lançado a campanha ‘Esporte para a Geração Igualdade’, para promover a igualdade de gênero no e por meio do esporte. “[A campanha] reúne cinco princípios: mais mulheres em posições de liderança; estratégias de prevenção e resposta à violência contra mulheres no futebol; oportunidades econômicas igualitárias; representação positiva na mídia e nos meios de comunicação para trabalhar as normas sociais e colocar mais meninas para jogar. A Copa vai trazer um legado se a gente trabalhar direitinho”, explicou Olga Bagatini, que faz parte da ONU Mulheres Brasil.
Fotos Theo Daolio
Hoje enxergo o futebol feminino melhor do que nosso futebol masculino pela garra das atletas, empenho e dedicação.
Mas como ainda existe um etarismo por parte de muitos homens o futebol feminino fica em segundo ou terceiro plano.