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Proibidas de Errar: O Duplo Padrão do Julgamento Feminino no Futebol

A cena é eloquente. Edna Alves, árbitra FIFA e uma das profissionais mais respeitadas do país, aparece em uma foto impactante: cercada por jogadores revoltados, protegida por policiais, e sob o escrutínio de milhares de olhares, tanto nas arquibancadas quanto nas telas.

Essa imagem vai muito além de uma simples discussão sobre arbitragem. Ela é um retrato cru e direto do que significa ser mulher no universo do futebol.

O Jogo que se Transforma

 

Quando uma mulher entra em campo, as regras não escritas do jogo se alteram. A exigência sobre ela é desproporcional.

Não basta ser competente.

Não basta estar preparada.

Ela precisa, de forma incansável, beirar a perfeição. O motivo é simples e cruel: o seu erro nunca será apenas um erro técnico. Será imediatamente capitalizado, usado como “prova cabal” de que ela “não deveria estar ali” em primeiro lugar.

 

A Máscara da “Neutralidade”

 

As críticas, muitas vezes, vêm embaladas em um verniz de falsa neutralidade, tentando disfarçar a misoginia inerente:

“Não é porque é mulher, é porque é ruim mesmo.”

“Mulher não tem cabeça para apitar jogo masculino.”

“Elas são horríveis, deviam apitar só o feminino.”

No entanto, basta raspar essa superfície para que a verdade se revele: o que está por trás é um amálgama de machismo, preconceito e a resistência de uma estrutura que se nega a aceitar a presença feminina em espaços de poder e decisão no esporte.

A Desigualdade da Crítica

 

É inegável que a arbitragem brasileira atravessa um período turbulento, com falhas graves cometidas tanto por homens quanto por mulheres. O problema reside no tratamento desigual dado a esses erros:

Quando um árbitro (homem) erra, ele é criticado, suspenso, e o foco é no desempenho individual.

Quando uma árbitra (mulher) erra, ela é crucificada, e a falha é generalizada para todo o gênero, servindo como munição para deslegitimar a presença de todas as mulheres na função.

 

Forjadas no Fogo

 

Ser mulher no futebol é viver sob a constante e sufocante ameaça do julgamento público. É, de fato, ser “proibida de errar”.

Contudo, essa pressão insana e injusta também molda uma poderosa narrativa de resistência. É um testemunho de força em um campo que, por séculos, ergueu barreiras para tentar expulsá-las.

É um paradoxo: Mulheres, sejam bem-vindas ao inferno do futebol. Mas é exatamente nesse fogo cruzado, nessa vigilância extrema, que a força é forjada, o profissionalismo é aperfeiçoado e a permanência é garantida.

Porque, apesar de todos os protestos, o futebol também é nosso território.

 

Foto :Ronaldo Barreto

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