O futebol brasileiro ainda carrega vícios estruturais que insistem em sobreviver ao tempo. Um deles é a tentativa recorrente de deslegitimar mulheres quando estas ocupam espaços de poder, visibilidade ou crítica qualificada. Por isso, o posicionamento público de Leila Pereira, presidente do Palmeiras, em defesa da jornalista Renata Mendonça, não é um mero gesto de cortesia. É um ato de liderança institucional.
Quando Leila afirma que de dirigentes de grandes clubes se espera conduta exemplar e jamais misoginia, ela transcende o cargo que ocupa no Alviverde. Ela fala como uma gestora que compreende que a governança também se constrói com valores, cultura e responsabilidade pública. Em um ambiente historicamente permissivo com ataques pessoais, estabelecer limites é um ato político necessário. E limites importam.
O ataque direcionado a Renata Mendonça, profissional cuja trajetória é pilar na cobertura do futebol feminino no Brasil, não é um fato isolado. Ele é o sintoma de um padrão arcaico: quando uma mulher aponta falhas estruturais, a resposta do sistema não é o debate de ideias, mas a tentativa de desqualificação pessoal. É a estratégia do silenciamento pelo constrangimento.
Ao quebrar a lógica do silêncio conveniente, Leila Pereira redefine o que entendemos por liderança no esporte. Ela demonstra que ocupar o topo da pirâmide exige mais do que administrar orçamentos; exige coragem para confrontar o status quo.
“Não basta ocupar cargos de poder; é preciso exercer esse poder com responsabilidade.”
Entretanto, este avanço não pode ser uma luta solitária. O apoio público de jornalistas homens a Renata Mendonça é um componente vital desta engrenagem. Combater o machismo no esporte não é uma “pauta feminina” ou um “recorte ideológico”. É uma pauta ética, profissional e coletiva. Quando homens se posicionam, eles ajudam a desmontar a barreira do corporativismo de gênero e validam o óbvio: o respeito e a liberdade de imprensa são inegociáveis.
O futebol brasileiro precisa, urgentemente, amadurecer suas relações. Divergências são a alma do esporte. Clubes podem e vão discordar de análises e críticas. O que é inadmissível é ultrapassar a fronteira da civilidade para recorrer a ataques de cunho pessoal. Quando um dirigente ataca uma jornalista por sua condição de mulher, ele não fere apenas uma profissional; ele fere a credibilidade de toda a instituição que representa.
O gesto de Leila Pereira aponta para um novo horizonte. Um futebol onde dirigentes entendem o peso de suas palavras, onde o ecossistema profissional é respeitado e onde a discordância gera debate, não violência simbólica.
Enquanto posturas como esta ainda causarem surpresa, saberemos que o caminho à frente é longo. Mas cada limite imposto e cada voz erguida ajudam a empurrar o futebol para um lugar mais justo.
Afinal, a verdadeira liderança não se mede apenas por troféus na estante ou balanços financeiros positivos. Mede-se, sobretudo, pela coragem de se posicionar quando o silêncio seria a opção mais confortável.
Suleima Sena Jornalista | Fundadora do Donas FC




